[...] Nessas horas lentas e vazias, sobe-me da alma à
mente uma tristeza de todo o ser, a amargura de tudo
ser ao mesmo tempo uma sensação minha e uma coisa
externa, que não está em meu poder alterar. Ah,
quantas vezes os meus próprios sonhos se me erguem
em coisas, não para me substituírem a realidade,
mas para se me confessarem seus pares em eu os
não querer, em me surgirem de fora, como o
elétrico que dá a volta na curva extrema da rua,
ou a voz do apregoador noturno, de não sei que
coisa, que se destaca, toada árabe, como um
repuxo súbito, da monotonia do entardecer![...]
Bernardo Soares
Do Livro do Desassossego
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